quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Manifesto

foto Mariele Góes

Há pedaços da rua para os pneus, para o óleo vazando do carro, para o toco de cigarro caído de uma janela. Há pedaços da rua para a sola do tênis coreano, para o bico fino que pode furar o asfalto a qualquer instante, para o pé descalço e rígido que vai e pára, vai e pára, nunca sabe aonde seguir. Há pedaços da rua para a poeira que não é de ninguém e que faz espirrar, para a fumaça tocando no chão e se despedindo em segundos, para o sangue de quem é otimista demais para crer que o sinal está vermelho. E ainda para cadeiras arremessadas, semáforos, cães, embalagens, buracos, vassouras, folhas outonais, bateria de celular roubado. Há pedaços da rua para o que vier, porque ela não se importa, porque ela sabe que não é nada além de uma busca por um fim. A rua é fácil e ninguém deveria querê-la. Mas nós, do movimento aSSAlto , não rejeitamos. Seria hipocrisia desprezar algo que nos é idêntico. Somos tão madalenas quanto a rua. Nossa vontade é estar para quem queira.
E a literatura vai como o pretexto. Pára-brisa, bolsa de gente desprevenida, balcão, consultório odontológico, mão de gringo que veio salvar nossas baianas, dendê saturado, tudo casa para papéis em que rabiscamos. Incômodo, invasão, terrorismo poético. A delícia do absurdo de literaturiar numa capital em que é preciso fugir amanhã.

Um comentário:

Anônimo disse...

salvador precisa mais disso,
parabéns.